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Reflexão

Repensando práticas pedagógicas para o fazer criativo

Para que a escola não se torne um espaço de inibição da criatividade, é preciso que ela seja um ambiente que promova atividades que estimulem o desenvolvimento criativo de seus atores.

Por: Bernoulli | Em: 20/06/2023

A escola deve promover o desenvolvimento de habilidades criativas dos estudantes. Contudo, diversas críticas a práticas educacionais alinhadas ao ensino tradicional evidenciam a necessidade de mudança no fazer pedagógico. Em muitos casos, o foco excessivo em métodos de ensino rígidos e ênfase desproporcional a uma mesma maneira de se avaliar os estudantes tendem a suprimir a imaginação e a originalidade dos estudantes. A pressão para a conformidade, a ênfase na busca de respostas corretas e a falta de incentivo à exploração criativa podem sufocar o potencial criativo dos estudantes. Para mitigar esse efeito, é fundamental que a educação proporcione ambientes que encorajem a expressão criativa, a livre exploração de ideias e o desenvolvimento de projetos individuais.

 

Uma conclusão comum e interessante em estudos sobre o desenvolvimento da criatividade em crianças e adolescentes diz respeito à descontinuidade ou padrão não linear de desenvolvimento (HUI; HE; WONG, 2019). Esses estudos mostram que o processo de desenvolvimento da criatividade não é contínuo; ao contrário, há quedas ou saltos súbitos associados a diferentes fases da infância e adolescência. Em um dos primeiros estudos sobre o desenvolvimento da criatividade na educação, Torrance (1963; 1968 apud HUI; HE; WONG, 2019) indica que a primeira queda no pensamento criativo das crianças se dá no ingresso à escola formal.

 

Após as descobertas iniciais de Torrance, muitos outros pesquisadores relataram uma queda no desenvolvimento da criatividade durante a infância e a adolescência. Pesquisas subsequentes concordam em sugerir que há ocorrência de uma queda na criatividade, a qual geralmente está associada à entrada na escolaridade formal e também na transição entre segmentos (Ensino Fundamental Anos Iniciais e Finais, e Ensino Médio).

 

Para que a escola não se torne um espaço de inibição da criatividade, é preciso que ela seja um ambiente que promova atividades que estimulem o desenvolvimento criativo de seus atores. No artigo “Creativity in the Classroom” de Beghetto (2016), o autor aborda várias barreiras que podem inibir a criatividade em sala de aula. Essas barreiras podem ser de natureza individual, social ou estrutural, e podem surgir tanto dos estudantes como dos próprios educadores e do ambiente escolar. Dessa maneira, torna-se necessário repensar práticas pedagógicas para ultrapassar algumas das barreiras expostas pelo autor. São elas:

 

1. Conformidade com normas e padrões rígidos: A ênfase excessiva em seguir padrões estabelecidos e a necessidade de aderir estritamente às normas acadêmicas podem limitar a expressão criativa dos alunos. Quando os estudantes sentem que precisam se adequar a respostas pré-determinadas, correm o risco de evitar a exploração de ideias originais e inovadoras.

 

2. Medo do julgamento e da crítica: O receio de serem julgados por seus pares ou professores pode levar os estudantes a se autocensurarem e a evitarem o risco de apresentar ideias diferentes. O medo do fracasso ou da rejeição pode inibir a criatividade, levando os estudantes a se conformarem com o status quo.

 

3. Ênfase na resposta correta: O foco excessivo em buscar respostas corretas e na obtenção de resultados padronizados pode desencorajar a exploração de múltiplas perspectivas e soluções alternativas para os problemas. Os estudantes podem se sentir pressionados a memorizar e seguir uma resolução específica para encontrar a resposta “certa” em vez de serem incentivados a buscar soluções criativas.

 

4. Avaliação tradicional: Sistemas de avaliação que valorizam principalmente testes padronizados e notas numéricas podem desencorajar a experimentação e a inovação. Os estudantes podem se sentir pressionados a se concentrarem apenas nas respostas que garantem pontuações mais altas, em vez de explorar abordagens criativas.

 

5. Falta de apoio e incentivo: Quando os estudantes não recebem encorajamento e reconhecimento por suas ideias criativas, podem se sentir desmotivados a continuar explorando sua criatividade. A falta de apoio por parte dos professores e colegas pode ser um obstáculo significativo para a expressão criativa dos estudantes.

 

Ficamos menos criativos com o passar do tempo?

 

Embora a criatividade seja uma característica presente desde a infância, é observado que, em muitos casos, ela tende a diminuir à medida que avançamos na idade adulta. Diversos fatores podem explicar esse declínio criativo.

 

Um dos principais é o enrijecimento das estruturas mentais, resultado da aquisição de conhecimentos e da internalização de normas sociais ao longo da vida. À medida que nos tornamos mais familiarizados com determinados domínios de conhecimento, tendemos a seguir padrões estabelecidos, dificultando a emergência de ideias novas.

 

Além disso, o medo do julgamento social e a aversão ao risco também podem desencorajar a expressão criativa. Com o passar do tempo, muitos indivíduos tornam-se mais cautelosos, evitando explorar novas possibilidades por receio de falhar ou serem rejeitados.

 

Pensando no contexto da educação básica, sabemos que na Educação Infantil as crianças se mostram naturalmente curiosas, imaginativas e espontâneas, características fundamentais da criatividade. Elas exploram o mundo com olhos investigativos e exploratórios, fazendo perguntas, inventam histórias e se expressam artisticamente com entusiasmo. Sobre a transição da Educação Infantil aos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, a BNCC demonstra preocupação em articular uma progressiva sistematização das estratégias às situações lúdicas de aprendizagem.

 

No entanto, à medida que avançam no Ensino Fundamental, encontram-se com um ambiente escolar mais segmentado, por vezes organizado sem diálogos integradores. Além disso, quando o trabalho centra-se apenas no conteúdo, sem pensar no desenvolvimento das habilidades, pouco espaço é deixado para a expressão criativa dos estudantes. Com isso, há uma tendência que os estudantes comecem a se preocupar mais com o desempenho em testes e provas e evite a exploração de ideias mais originais e desafiadoras.

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